Blog Direito
Lato Sensu, de autoria de Álaze Gabriel.
Autoria:
Maria Cristina Cacciamali. Professora do Departamento de
Economia e Presidente do Programa de Pós-Graduação em Integração da América
Latina da Universidade de São Paulo.
RESUMO
Este artigo desenvolveu-se em torno de dois
objetivos: apresentar as características primordiais das reformas laborais na
América Latina; e indicar as características do mercado de trabalho
contemporâneo, e os desafios para promover e institucionalizar direitos
fundamentais, a fim de evitar a deterioração das condições de trabalho e renda
para parte expressiva da força de trabalho.
Palavras-chave: política pública; trabalho na América Latina; direitos sociais.
Palavras-chave: política pública; trabalho na América Latina; direitos sociais.
INTRODUÇÃO
A liberalização do comércio
reascende o debate sobre a promoção de padrões mínimos laborais. Os interesses
suscitados por essa questão confrontam-se principalmente em dois fóruns:
relações comerciais internacionais e defesa dos direitos humanos, embora essa
problemática, suas repercussões e decorrências transcendam esses dois âmbitos,
pois intervêm na legislação e nas práticas laborais de cada país envolvido,
além de introduzirem novos valores e regras de funcionamento em adição às
características de seus mercados de trabalho.
A expansão do comércio entre as nações insere o
tema na definição de suas regras multilaterais na Organização Mundial do
Comércio (OMC), sob a denominação de cláusula social. Caso determinadas
normas laborais sejam aprovadas, obrigarão as partes a cumpri-las, sob pena de
sanções legais ¾ multas e suspensão de exportações. A inclusão de direitos
trabalhistas nas relações comerciais internacionais transformou-se em proposta
política que divide os países em uma perspectiva norte-sul. Os governos dos
países industrializados, com o apoio do setor empresarial e dos sindicatos,
lideram a demanda de elevar internacionalmente os padrões mínimos trabalhistas,
defrontando-se com a resistência dos governos e empresários dos países em
desenvolvimento. Na prática, para estes últimos, os padrões mínimos representam
aumento dos custos do trabalho e, principalmente, uma restrição adicional para
suas exportações, visto que qualquer denúncia de infração implicaria em sanções
comerciais, multas e/ou paralisação temporária das exportações, o que
restringiria o desenvolvimento de seu sistema comercial.
Os circuitos de informação, por outro lado,
difundem a implementação de programas de defesa dos direitos humanos por
iniciativa de instituições internacionais que compõem a Organização das Nações
Unidas (ONU). Essa disseminação influencia mudanças de valores, ações políticas
e políticas públicas em escala planetária, e também na definição e adoção de
padrões mínimos trabalhistas. Estes últimos, sob a orientação da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), são apresentados e passam a ser compreendidos
como direitos humanos.1
A Declaração sobre os Princípios e Direitos
Fundamentais no Trabalho foi adotada na Conferência Internacional do Trabalho
da OIT em 18 de junho de 1998, 50 anos depois da Declaração Universal dos
Direitos Humanos da ONU, e desenvolve os direitos humanos compreendidos na área
de competência da OIT, que adicionalmente também compõem a agenda da OMC. São
quatro princípios que regem os direitos fundamentais, a saber: i) livre
associação e reconhecimento do direito de negociação coletiva; ii) eliminação
de todas as formas de trabalho forçado; iii) efetiva abolição de trabalho
infantil; e iv) eliminação da discriminação com relação ao emprego e à
ocupação. Esses princípios constituem uma base mínima universal de direitos do
trabalho para todos os países membros, independente de sua ratificação das
convenções pertinentes.2
O acompanhamento das medidas tomadas e dos avanços sobre seu cumprimento é
realizado por meio de relatórios anuais encaminhados pelos governos,
empregadores, trabalhadores, ou em conjunto à OIT. Essa instituição, por sua
vez, disponibiliza assistência técnica e outras formas de apoio para sua
promoção e implementação.
Os países em desenvolvimento, embora apresentem
resistência em acordar formalmente quaisquer dos itens integrantes da cláusula
social, em virtude das possíveis sanções e potenciais prejuízos comerciais,
estão avançando na aceitação e implementação dos quatro princípios e direitos
fundamentais no trabalho. Indicadores, retirados de documentos oficiais da OIT,
evidenciam essa evolução positiva: vários governos manifestam a intenção de
ratificar com a OIT uma ou mais convenções pertinentes; o número de governos
que informam sua situação e as medidas tomadas em relação a essa matéria vem
aumentando (67% do total dos relatórios devidos); a base de informações tem
sido aprimorada; assim como há maior envolvimento efetivo na implementação de
medidas por parte de associações de empregadores e trabalhadores, e de ONGs.
Ademais, verifica-se tendência ascendente em quase todos os países de mudar as
constituições e outras legislações, e formular programas e medidas para
possibilitar sua implementação, até entre os países mais pobres da África e da
Ásia (ILO, 2001).
Os quatro princípios são encadeados com o objetivo
de reforçarem-se, entretanto, o princípio da livre associação e reconhecimento
do direito de negociação coletiva tem sido reconhecido na literatura
especializada como um elemento importante para implementar os demais (ILO,
2001; OECD, 2000). Trabalhadores na agricultura, no serviço doméstico,
imigrantes, os inseridos em pequenas empresas e no setor informal3
não são contemplados, em muitos países, pela legislação laboral e da seguridade
social e encontram-se excluídos tanto dos direitos trabalhistas derivados da
operacionalização dos princípios, quanto da possibilidade de participarem e
serem beneficiados pelas negociações coletivas.
O ambiente econômico contemporâneo, por outro lado,
configura um tipo de mercado de trabalho no qual um dos traços marcantes é o
aumento da insegurança laboral, subjetiva e objetiva.4
Essa insegurança deriva tanto do menor ritmo de crescimento econômico e
conseqüente menor criação de oportunidades de emprego, como das mudanças
institucionais implementadas para atender às necessidades da flexibilidade
laboral, e aquelas originárias das mudanças tecnológicas e da reestruturação
produtiva, como, por exemplo, aumento do desemprego, mudança no conteúdo das
ocupações e maior necessidade de manter a empregabilidade, entre outras.
Assim, o aprofundamento do processo de internacionalização
das economias, e das próprias sociedades, latino-americanas decorrente da maior
liberalização comercial, induz um conjunto de desafios, nos campos da política
trabalhista e da política social, para promover o progresso social e a
distribuição de renda paulatinamente ao aumento da riqueza.
Este trabalho foi desenvolvido para produzir
subsídios para o debate e a construção de um quadro de referência macrossocial
para analisar e delinear políticas públicas no campo social e trabalhista na
América Latina, sem a pretensão de abordar ou exaurir todas as suas dimensões.
O recorte de análise privilegiou dois objetivos específicos. O primeiro,
elaborado na primeira seção, é apresentar as características primordiais das
reformas laborais nos países da região, paulatinamente à perda de
representatividade dos sindicatos, à maior flexibilização das relações de
trabalho e ao avanço do processo de informalidade no mercado de trabalho,5
no qual, entre as suas principais características, pode ser destacada a
diminuição da cobertura da seguridade social pública. Este objeto foi
selecionado pela importância dos sindicatos e das negociações coletivas nas
ações para implementar os direitos fundamentais no trabalho. O segundo objetivo
específico, discutido na seção seguinte, analisa as características do mercado
de trabalho contemporâneo, e os desafios para promover e institucionalizar
práticas e direitos trabalhistas nesse contexto. Destacamos, nesse âmbito, a
necessidade de desenvolver abordagens sociais e econômicas nos níveis meso e
micro para superar as limitações da menor taxa de crescimento econômico e do
emprego, impostos pelo comportamento e pelas características dos mercados de
trabalho, e pelo quadro e política macroeconômicos.
REFORMAS LABORAIS E INFORMALIDADE NO MERCADO DE
TRABALHO
Na América Latina a adoção de regimes democráticos
em quase todos os países e a ratificação dos convênios de nos
87 e 98 da OIT influenciam as reformas laborais que são implementadas na
maioria dos países, a partir dos anos 90. As mudanças orientam-se no que se
refere às relações coletivas do trabalho assalariado na direção de maior
autonomia, e de descentralização das negociações. Desse modo, entre as
modificações introduzidas salientam-se: supressão de normas restritivas ao
direito de associação; simplificação dos procedimentos burocráticos para
organizar um sindicato; e ampliação do direito de sindicalização a categorias
de trabalhadores que não tinham acesso, como, agricultores, funcionários
públicos, trabalhadores eventuais ou autônomos. Nesse mesmo sentido, a maioria
dos países introduz em suas legislações trabalhistas dispositivos com intuito
de promover as negociações coletivas, como por exemplo: ampliação do número de
itens a serem negociados; prevalência da convenção coletiva sobre o contrato
individual; obrigatoriedade de negociação coletiva por meio de sindicatos;
obrigatoriedade de contribuição aos beneficiários de uma convenção coletiva que
não são sindicalizados; e a negociação da flexibilização de componentes do
contrato individual de trabalho.
A despeito das mudanças da legislação, os
sindicatos na maioria dos países da América Latina possuem pouco poder de
barganha e baixo índice de filiação. A baixa taxa de crescimento econômico, que
vem acompanhando a liberalização do comércio, aumenta a desorganização dos
mercados de trabalho que pode ser caracterizada pelo aumento das taxas de
desemprego, maior grau de informalidade e mudanças em suas formas de expressão
(Cacciamali, 2000). Em muitos países a elevada participação dos trabalhadores
em pequenas e médias empresas e a perda da importância das negociações
setoriais em face da descentralização favorecem a negociação por empresa e
debilitam a organização e o poder de barganha dos sindicatos. A
descentralização das negociações, se bem que pode favorecer o diálogo entre as
partes e permitir alcançar de forma mais veloz a solução de problemas específicos
do local do trabalho,6
aumenta ainda mais a assimetria do poder de barganha relativa ao empregador, em
especial em uma estrutura de produção de pequenos e médios estabelecimentos e
em um mercado de trabalho com elevadas taxas de desemprego. Peru e Argentina,
por exemplo, descentralizam a negociação coletiva, e no segundo país, o governo
promulga uma legislação específica para a pequena e média empresa, na qual por
cláusula de contrato coletivo permite ao empregador, entre outras, contratar
trabalhadores por tempo determinado, diminuir período de férias, redefinir
postos, atividades e funções de trabalho.
Além disso, acompanhando as tendências observadas
nos países industrializados, embora com velocidade menor, as negociações e os
contratos coletivos implementados não apenas nos setores mais dinâmicos da
economia, mas também no segmento pequeno e médio, como na Argentina, vêm sendo
um dos principais instrumentos para flexibilizar relações de trabalho, e
reduzir na prática os direitos trabalhistas.7
Há registros de que a jornada de trabalho padrão, por exemplo, é substituída,
em quase todos os países, por arranjos que consideram diferentes sistemas de
compensação ¾ anualizadas ou por contagem mensal ou semanal, limitando-se a
jornada diária em geral para 10 horas ¾, diminuindo a utilização das horas
extras e seu sistema de remuneração adicional. Na Argentina, Brasil e Uruguai,
as negociações coletivas introduzem a prática cada vez mais freqüente de compor
a remuneração total do trabalhador pelo salário adicionado de uma parcela
variável determinada por indicadores vinculados ao desempenho da empresa, como
participação nos lucros, produtividade, diminuição de custos, índice de
qualidade, etc. (Dieese, 1999; Toledo, 1997; Hirata, 1999; Marión e Vega,
2000).
Os contratos individuais de trabalho, por sua vez,
também são modificados por meio de legislações que ratificam a flexibilização
das relações de trabalho e a redução de seu custo. Estudo recente contemplando
18 países latino-americanos indica que a maioria dos países da região adotou
mudanças no contrato individual de trabalho, introduzindo contratos por tempo
determinado, diferentes formas de subcontratação, extensão do período de
experiência, ampliação dos motivos que permitem, e simplificam, os
procedimentos para a dispensa injustificada e redução das indenizações (Marión
e Vega, 2000).
Os contratos por tempo determinado8
reduzem os benefícios do trabalhador com relação à seguridade social, em
virtude do tempo descontínuo de contribuição. Além disso, em alguns países,
esses contratos foram formulados prevendo menores contribuições por parte dos
empregadores e diminuindo a abrangência dos direitos sociais e benefícios. O
resultado é o estabelecimento de dois tipos de trabalhadores: aqueles com
abrangência plena dos direitos sociais, subdivididos ainda por categorias de
trabalhadores de acordo com regimes previdenciários especiais; e aqueles com
abrangência limitada. Nesses termos, não restringir a utilização dessa
modalidade de contrato para um percentual de novos empregos ou defini-los
apenas para a fase inicial do ciclo de vida profissional, por exemplo, jovens
ou primeiro emprego, constitui um fator adicional para a não-contribuição ao
sistema de seguridade social e pode ter conseqüências sobre o nível de renda e
a qualidade de vida das camadas populares, ampliando os índices de pobreza. As
cooperativas de trabalhadores também representam uma expressão freqüente de
subcontratação de produtos e serviços no Peru e Brasil, por exemplo. Essa forma
de terceirização não considera os sócios de uma cooperativa como empregados
assalariados, portanto não há regra jurídica explícita que caracterize o
vínculo de subordinação e continuidade entre empregador e empregado. Dessa
maneira, os trabalhadores inseridos nessa relação de trabalho não se encontram
incorporados nem ao sistema sindical, nem ao da seguridade social, e não
possuem algum direito trabalhista, como salário mínimo da categoria
profissional, proteção contra enfermidade ou doença profissional, férias, horas
extras, entre outros.
Uma das justificativas recorrente dos governos e
representantes dos interesses empresariais para alterar as legislações
trabalhistas nesta direção é a de diminuir o grau de informalidade do mercado
de trabalho, incorporando maior número de trabalhadores ao sistema de
seguridade social. Essa tendência, entretanto, não vêm ocorrendo em vários
países da região, como Brasil e Argentina, por exemplo (Tokman e Mártinez,
1999; Cacciamali, 2000).9
A não-contribuição à seguridade social, além disso, foi agravada pela expansão
do setor informal, pois uma das conseqüências das menores taxas de crescimento
econômico, da reorganização do espaço e da estrutura produtiva e da
concentração da renda na América Latina é a ampliação do espaço econômico para
a ocupação no setor informal.10
Entre as economias mais importantes da América Latina, ao final da década de
1990, segundo estatísticas oficiais ¾ em geral subestimadas pela complexidade e
difícil mensuração do fenômeno ¾, quase metade dos ocupados exerce seu trabalho
nesse setor, exceto Chile e México que apresentam níveis em torno de 40%. A
deterioração institucional do mercado de trabalho na maioria dos países
latino-americanos vem acarretando a diminuição da cobertura da seguridade
social pública que alcança, nesse mesmo período, cerca de dois terços do total
dos ocupados dos setores público e privado, exceto no Chile onde o percentual
atinge 77%.
Ao excluirmos do total de
ocupados aqueles que se encontram no setor público, o grau de cobertura pode
ser menor. No Brasil, por exemplo, considerando apenas os ocupados do setor
privado, o número de contribuintes em 1999 alcança o percentual de 46%. Esse
indicador, contudo, esconde diferenças significativas entre regiões e Estados,
e entre categorias de posição na ocupação. Nas regiões Norte e Nordeste, por
exemplo, o grau de cobertura é de 27% e 29%, respectivamente. Entre os
assalariados do setor privado, o grau de cobertura da legislação trabalhista e
previdenciária chega a atingir 59% e 54% nas regiões Sul e Sudeste, entretanto,
na região Nordeste para cada 100 assalariados com carteira assinada no setor
privado, 132 trabalham sem registro, e na região Norte essa relação é de 124. A
cobertura nas demais formas de inserção no trabalho é ainda mais limitada.
Entre os empregados domésticos da região Norte, estima-se que o grau de cobertura
seja de 7% e entre os trabalhadores por conta própria e empregadores da região
Nordeste a incidência é próxima de 11% (Cacciamali, 2001). Estima-se, na média
brasileira, que para cada 100 reais de contribuição, 67 não sejam pagos. Esse
comportamento difere substancialmente entre regiões. A diferença entre os
Estados, conseqüentemente, também é bastante elevada, por exemplo,
considerando-se as situações extremas, estima-se que no Tocantins e no Maranhão
para cada R$ 100,00 de contribuição, R$ 217,00 não sejam pagos; enquanto nos
Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo essa
relação é de R$ 100,00 para respectivamente R$ 43,00, R$ 47,00 e R$ 49,00 para
os dois últimos Estados11
(Cacciamali, 2001).
A impossibilidade de poder contar
com uma atuação mais efetiva do movimento sindical na América Latina para
implementar direitos trabalhistas, a deterioração institucional e a crescente
insegurança percebidas no mercado de trabalho da região remete à necessidade de
avaliar as características, o comportamento e as condições de reprodução desse
mercado de uma forma mais abrangente. Este é o objetivo da próxima seção, que
em primeiro lugar analisa características do mercado de trabalho contemporâneo
e em segundo lugar propõe quatro eixos de análise para discutir a formulação de
políticas públicas que criem um ambiente favorável para a promoção dos direitos
fundamentais no trabalho.
CARACTERÍSTICAS DO MERCADO DE TRABALHO E DESAFIOS
INSTITUCIONAIS
A mudança do padrão de acumulação nas sociedades
contemporâneas, desde os anos 70, apresenta um conjunto de características que
induzem profundas modificações no mercado de trabalho, entre as quais,
apresentamos, de forma estilizada, as mais importantes:
- os resultados da política macroeconômica que
apóia a expansão comercial mundialmente mostram, para a maioria dos países da
América Latina, menores taxas de crescimento econômico e menores oportunidades
de emprego, refletindo-se em maiores taxas de desemprego e subemprego. A
maioria dos países industrializados também apresenta desempenho similar; na
expressão de Rodrik (1997:11) esse modelo não tem sido capaz de produzir
"nem nos Estados Unidos nem na Europa crescimento sustentado de 'bons
empregos'". Nos Estados Unidos, a pauta do debate sobre o tema compreende
a importância da abertura comercial na ampliação do diferencial de salário
entre mais qualificados (universitários) e menos qualificados (diplomados até o
segundo grau); a maior desigualdade salarial entre os trabalhadores
qualificados, e a decorrente ampliação na desigualdade da distribuição de
renda; e a maior instabilidade da demanda de trabalho, ocasionando volatilidade
de rendimento e de horas trabalhadas (Rodrik, 1997; Katz e Revenga, 1989). Na
Europa, dominam esse debate: o alto nível de desemprego; o crescimento de
empregos flexíveis; e o aumento do grau de insegurança laboral (Freyssinet et
alii, 2000; Rodgers e Rodgers, 1989; Standing, 2000). Enquanto na América
Latina, discutem-se a ampliação do desemprego; o aumento do emprego no setor
informal, no serviço doméstico e em empregos sem contrato de trabalho
registrado (León, 1999; Baltar et alii, 1996; Cacciamali, 1999 e 2000).
- a liberalização comercial acompanha processos de
reestruturação produtiva que em geral implicam mudanças tecnológicas mais
intensivas em capital, mudanças na estrutura ocupacional e no conteúdo das
ocupações. Estas mudanças tecnológicas poupadoras de trabalho são introduzidas
em um ambiente de menor crescimento econômico o que vem a ratificar a menor
criação de empregos. Tecnologia intensiva em capital e mão-de-obra qualificada,
por outro lado, são geralmente complementares na estrutura produtiva, fato que
aumenta a demanda de trabalho por mão-de-obra qualificada e o diferencial de
salários em favor desse tipo de mão-de-obra (Bound e Johnson, 1992; Krueger,
1993);
- a liberalização do comércio e maior grau de
concorrência intercapitalista ratificam não só as mudanças dos métodos de
produção e dos processos de trabalho, como também introduzem relações de
trabalho compatíveis com as necessidades de redução de custos. Entre as
principais modificações devem ser destacados: rompimento do vínculo entre o
aumento dos salários e o aumento da produtividade; maior intensidade do trabalho;
maior subcontratação; menor estabilidade na maioria dos empregos e menor
abrangência da proteção social pública (Cacciamali, 2001);
- a maior integração dos mercados de produtos e
serviços domésticos à economia mundial, além de diminuir margens de lucro,
elevam a elasticidade de preço da demanda dos bens e a elasticidade da oferta
de todos os fatores de produção, mesmo aquela da oferta do fator trabalho,
possibilitando a substituição entre categorias de mão-de-obra e entre o fator
trabalho e outros fatores de produção. Esses comportamentos, seguindo as Leis
Hicks-Marshall da demanda derivada, aumentam a elasticidade da demanda de
trabalho, restringindo tanto os aumentos dos custos diretos e indiretos do
trabalho, como retirando poder de barganha dos sindicatos;
- o aumento da elasticidade da demanda de trabalho,
com intensidade diversa entre os diferentes setores da economia, contribui para
a fragmentação do poder sindical e reordena as reivindicações trabalhistas para
interesses corporativos, diminuindo a importância de demandas universais,
conforme observa-se no movimento sindical de diferentes países da América
Latina.
Esses aspectos introduzem um conjunto de desafios
teóricos, políticos e institucionais para definir padrões trabalhistas e políticas
públicas. Focalizando a região latino-americana, a superação desses desafios
exige mudanças institucionais que compreendem o fortalecimento de enfoques meso
e microeconômicos, tendo em vista a dificuldade de articular interesses e
recursos para as ações de políticas públicas nesses níveis. Entre aqueles que
julgamos importante destacar, selecionamos quatro eixos de análise que são
expostos a seguir.
DEFINIR POLÍTICAS DE EMPREGO EM UM AMBIENTE DE
MAIOR COMPETITIVIDADE
Aumentar investimentos, retirando obstáculos
institucionais e realizando articulações políticas para sua implementação,
propicia aumento na taxa de crescimento econômico e nas oportunidades de
emprego. Esta é a alavanca do desenvolvimento econômico. A liberalização das
economias e sua maior integração à economia mundial não garantem maiores
investimentos diretos estrangeiros nem domésticos (Rodrik, 1999). Desse modo,
para os países latino-americanos, manter as condições de estabilidade da
economia e ajustar o déficit público, e conseqüente menor dependência de
financiamento externo, abre espaço para a redução das taxas de juros
domésticas, ampliando as possibilidades de investimento e de promoção ao acesso
ao crédito. Entretanto, além dessa estratégia macroeconômica, a articulação
política entre governo e empresários para criar e manter a infra-estrutura
necessária e promover o acesso ao crédito depende de arranjos e mecanismos
institucionais eficazes para sua consecução. Um quadro macroeconômico
consistente com os fundamentos econômicos e o funcionamento do mercado por si
só não são suficientes para atrair os investimentos requeridos para dinamizar
as economias.
A política pública e as ações do governo são
essenciais para estabelecer uma estratégia de investimento que deve compreender
não apenas a implementação de uma estrutura tributária adequada e a formulação
de políticas substitutivas de importações orientadas para a exportação (redução
das tarifas para a importação de bens de capital e indução de investimentos em
infra-estrutura, por exemplo), como também a transparência dos mecanismos
utilizados e a redução de obstáculos burocráticos e administrativos. Medidas
para ampliar os mercados domésticos também são essenciais para os países
latino-americanos que têm elevado grau de concentração da renda, que podem ser
corroboradas mediante o próprio crescimento econômico, embora a manutenção da
estabilidade de preços e a implementação de políticas redistributivas
constituam-se em pré-requisitos.
Esses objetivos são permeados por fortes interesses
políticos e econômicos ¾ setoriais, regionais e internacionais ¾, e procurar
atingi-los muitas vezes resulta em inconsistência a curto prazo; algumas metas,
além disso, podem ser atingidas de forma significativa apenas em prazos mais
longos, como a redistribuição da renda e o aumento sistêmico da produtividade.
O desempenho econômico pode ser satisfatório, sob a óptica de seus fundamentos,
os resultados sociais, entretanto, podem deixar a desejar, sobretudo quando se
trata da inclusão aos benefícios do crescimento econômico de determinados
grupos étnicos, setores ou regiões.
Portanto, a política macroeconômica não pode deixar
de ser complementada por meio de abordagens meso e micro que se concretizam
mediante políticas de desenvolvimento regional/local e setoriais. Estas são
instrumentos eficientes no diagnóstico de oportunidades econômicas e eficazes
na articulação de interesses políticos e econômicos, além de, quando
implementadas, diminuir desperdícios e ampliar os efeitos multiplicadores das
iniciativas, caso sejam aplicados mecanismos de transparência e de controle
social.
Adicionalmente, podem ser criados arranjos
institucionais factíveis para investimentos e o crescimento de segmentos pouco
integrados aos sistemas de inovação tecnológica e de crédito. O caso das
pequenas e médias empresas é paradigmático. O aumento do nível de renda amplia
o mercado e o potencial de fortalecimento para esse segmento, entretanto, seu
acesso ao sistema de crédito é limitado em virtude de sua lógica intrínseca de
aversão ao risco, que requer garantias reais para o cumprimento dos contratos.
Muitas das limitações de crédito a esse segmento
decorrem da ausência dessas garantias por parte do demandante do empréstimo,
e/ou da assimetria de informação entre as partes envolvidas na transação: o
demandante do empréstimo pode avaliar de forma mais adequada às suas
possibilidades de cumprir o contrato do que o credor; o credor, por sua vez,
defronta-se com problemas decorrentes de seleção adversa ou de risco moral.
Nesse sentido, a criação de mecanismos e
instituições de micro crédito focalizados nessa problemática e tipo de
clientela, e o desenvolvimento de metodologias e sua aplicação podem incorporar
maior número de empreendimentos e empreendedores ao processo de crescimento. Para
tanto, programas de desenvolvimento e redes de crédito locais (ONGs, Bancos
populares, ou Departamentos sociais em bancos privados ou públicos), integrados
a programas de desenvolvimento local ou setorial podem permitir o acesso ao
crédito e amplificar os benefícios do crescimento econômico, além de poder,
inclusive, diminuir os efeitos da instabilidade da demanda ou do menor ritmo do
crescimento econômico sobre os níveis de emprego e renda.
ESTRATÉGIAS DE PRODUTIVIDADE E RELAÇÕES DE TRABALHO
A utilização de empregos flexíveis12
possui pelo menos dois atributos para as empresas no cenário contemporâneo:
diminui os custos ¾ diretos e indiretos ¾ do trabalho; e permite com maior
velocidade o ajustamento do emprego em um ambiente caracterizado por mercados
mais competitivos e com maior flutuação de demanda. A redução dos custos nesses
tipos de contrato pode ser auferida pelos menores custos diretos envolvidos na
transação (remuneração total: salários, outros benefícios; diminuição de
alíquotas à contribuição social; menor indenização no ato da dispensa) e pela
redução dos custos indiretos (menores custos de recrutamento, seleção, treinamento
e perda do treinamento no ato da dispensa). No limite, a redução dos custos
indiretos concretiza-se com práticas de subcontratação, nas quais uma relação
de trabalho, subordinada aos estatutos trabalhistas (códigos, regras e
tributos), é transferida para uma relação comercial, sujeita aos estatutos
comercial e civil. Na maioria dos países latino-americanos, conforme já
exposto, as reformas laborais têm corroborado esses aspectos, destacando-se o
caso do Brasil que na modalidade de contrato por tempo determinado não altera
as alíquotas da contribuição social. O segundo atributo salientado, o
ajustamento do emprego, decorre do anterior: a diminuição dos custos do
trabalho, bem como da pequena institucionalidade dos contratos de trabalho. Ele
pode ser efetuado em duas dimensões: numérica (horas e número de empregados) e
qualitativa (intensidade do trabalho, mudança de atividades e funções, e
exigência de habilidades e qualificações).
A despeito desses fatos, vasta literatura
especializada foi produzida para demonstrar que a falta de experiência e de
compromisso dos trabalhadores podem diminuir os níveis de produtividade e a
qualidade dos serviços prestados, comprometendo o desempenho da empresa,
especialmente nos médio e longo prazos (Akerloff e Yellen, 1986 e 1990; OIT,
1997). Seja como for, a definição de estratégias de produtividade deve
considerar a formulação de normas laborais e contratos coletivos que objetivem
propiciar maior estabilidade aos trabalhadores, investimento nas pessoas e
sistemas de remuneração que promovam a produtividade e a qualidade, como, por
exemplo: adicionais por desempenho, por mérito, além de obedecer a critérios de
justiça salarial.13
Maior transparência dos mecanismos e dos resultados das negociações coletivas
referentes às empresas que praticam de forma permanente a subcontratação, e a
extensão de uma forma planejada de determinados benefícios alcançados para os
trabalhadores das empresas subcontratadas podem diminuir as diferenças nas
condições de trabalho e de remuneração, entre trabalhadores permanentes e
terceirizados. Convém destacar que a desigualdade pode ser diminuída, por meio
do aumento da produtividade nas seguintes situações: estabilidade no emprego;
aquisição de treinamento e de hábitos adequados para o exercício do trabalho; e
prevenção e diminuição dos riscos no campo da saúde e segurança do trabalho.
PROMOVER INSTITUIÇÕES QUE OBJETIVAM FORTALECER O
PROGRESSO SOCIAL: O SISTEMA DE SEGURIDADE SOCIAL
Atingir essa meta compreende, além da adesão dos
países às normas fundamentais do trabalho, o seu cumprimento, o que implica aumento
dos custos do trabalho e realocação ou aumento do gasto público para aumentar a
eficácia da fiscalização. Além disso, a política pública deve orientar-se para
o desenvolvimento da consciência coletiva e manter e ampliar espaços para que
sindicatos e outras organizações da sociedade civil constituam-se em suporte à
transparência e à fiscalização. A banalização do não-cumprimento das leis
conduz a comportamentos oportunistas, à quebra de laços de solidariedade
social, provocam a erosão da autoridade do Estado e à perda de receita para
fazer frente aos investimentos sociais, gastos da seguridade e assistência
social. Dessa maneira, os trabalhadores que exercem seu trabalho assalariado ou
sua atividade por conta própria ou como microempresário à margem da legislação
laboral14
devem ser incorporados ao sistema de seguridade social.
Essa proposição encerra uma contradição para a ação
da política pública pela óptica macroeconômica, pois em um ambiente de
liberalização comercial com fortes desajustes macroeconômicos, aumentos de
custos de produção e dos serviços governamentais, aumentariam ainda mais o
desajuste das contas públicas, além de poder provocar inflação. Entretanto, um
enfoque meso ou microeconômico aponta possibilidades para ampliar a abrangência
da cobertura da seguridade social por meio do aumento da eficiência e eficácia
do sistema. A reduzida contribuição à seguridade social pública nos países em
desenvolvimento, conforme apontado pela literatura especializada, deve ser
remetida em primeiro lugar à pobreza, entretanto o desenho institucional do
sistema também pode ser considerado inadequado diante de características da
maioria da população (Mesa Lago, 1994; Ginneken, 2000). Um conjunto de
restrições pode ser removido com o objetivo de ampliar a cobertura, como por
exemplo:
- diminuir as alíquotas de contribuição. No Brasil,
por exemplo, a contribuição para os trabalhadores por conta própria é da ordem
de 20% de sua renda;
- simplificar os registros, e remover dificuldades
burocráticas e administrativas para cadastramento e inscrição;
- ampliar as informações sobre os objetivos e
funcionamento do sistema, aumentando a confiança e alterando o comportamento da
população mais pobre que privilegia o uso de sua renda limitada para bens e
serviços destinados à sua sobrevivência imediata;15
e
- modernizar, manter a continuidade e melhorar a
qualidade dos serviços prestados.
O sistema foi implementado referenciado a um
conjunto de características demográficas e do mercado de trabalho que não
correspondem à situação atual. Exemplos dessa situação, conforme exposto
anteriormente, são a maior proporção de ocupados no setor informal ¾ por conta
própria, microempresários e no serviço doméstico ¾ e de assalariados na
informalidade, que pode chegar a representar nos países latino-americanos pouco
mais da metade do total de ocupados. Essa composição de formas de trabalho,
atomizada em excesso, aumenta o custo e dificulta a fiscalização, salvo
implementação de reformas administrativas. Como conseqüência, o sistema, além
de mostrar sinais de esgotamento, apresenta ineficiência e crescentes problemas
financeiros que questionam sua sustentabilidade, exigindo reestruturação.
EQÜIDADE, DESENVOLVIMENTO HUMANO E POLÍTICAS
SOCIAIS
Os países latino-americanos mostram índices de
desenvolvimento humano insatisfatórios, bem como elevados índices de pobreza e
de desigualdade na distribuição de renda. Deve-se levar em conta que os
indicadores expostos na Tabela 3 referem-se à média nacional,
portanto não revelam disparidades regionais ou entre grupos étnicos ou de
gênero. O indicador de pobreza pode estar subestimado, visto as condições
macroeconômicas ou sociais terem piorado nos últimos dois anos, em quase todos
os países da região. Além disso, a cobertura da educação formal não capta nem o
analfabetismo funcional ou a evasão ao sistema escolar. Não se encontram
disponíveis para a região indicadores de desigualdade por gênero ou etnia,
entretanto, há uma tradição de atribuir posições sociais subalternas às
mulheres e populações não brancas, bem como elevado grau de desigualdade social
e econômica entre as populações branca, negra e autóctone.16
Atingir melhor desempenho social requer ¾ além de
manter adequado ambiente macroeconômico para buscar o desenvolvimento
sustentável ¾ políticas sociais persistentes com base na definição de
prioridades nacionais e implementadas de acordo com critérios retirados de
programas sociais bem-sucedidos em diferentes países, que se citará a seguir:
- coordenação para evitar duplicação de esforços e
desperdício de recursos;
- boa focalização;
- de forma descentralizada e local;
- envolvimento de atores locais e maior interação
entre diferentes atores e parceiros sociais;
- concentração dos recursos nas atividades fins,
minimizando despesas administrativas;
- contar com monitoramento e avaliação de seu
impacto e efetividade, bem como dependendo do tipo de política, como por
exemplo microcrédito, sustentabilidade;
- ademais, as ações que utilizam metodologia com
abordagens integrais mostram resultados superiores (ILO 2001).
Essa orientação fortalece os atores sociais e
aprofunda o processo democrático por meio da promoção ou da criação do diálogo
social. Nesse sentido, desde 1990, vários governos de países da América Latina,
no qual se destaca o Brasil, esboçam e paulatinamente consolidam um novo
desenho de política social e trabalhista: descentralizam as ações, inserem a
participação de organizações da sociedade civil e articulam órgãos e fundos
públicos. Os espaços públicos de diálogo social, no Brasil, foram institucionalizados
nos diferentes campos da política social, como, por exemplo, saúde, educação,
infância e adolescência, trabalho e assistência social, e nos diferentes níveis
de governo. Os mecanismos de organização dos interesses da comunidade, sua
representatividade, as condições efetivas de trabalho dessas comissões e a
adoção de políticas integradas mostram-se ainda incipientes, reduzindo a
formulação, a transparência e o controle das ações em muitos municípios e
Estados; contudo, resultados positivos, inseridos no novo desenho institucional
podem ser observados, em especial na contenção dos índices de pobreza,
mortalidade infantil, trabalho infantil, bem como, cobertura do sistema escolar
público e promoção da capacitação profissional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A liberalização do comércio e a maior
internacionalização das economias, conforme analisado neste trabalho, impõem na
maioria dos países latino-americanos um quadro macroeconômico que conduz a
profundas modificações na atuação dos sindicatos, na definição das relações e
contratos de trabalho, no sistema de seguridade social público, e nas condições
concretas sob as quais o trabalho é realizado. Esse contexto reduz as
possibilidades de introduzir e implementar os direitos fundamentais no
trabalho, à medida que lhe elevam os custos. Entretanto, essa situação pode ser
paulatinamente revertida, caso a par de uma política macroeconômica consistente
com o crescimento sustentável, e as políticas econômica e social sejam
orientadas para os níveis meso e macro, por meio de ações de desenvolvimento
local e setorial. A elevação do nível de investimento, por exemplo, não pode
prescindir de uma estratégia de governo que contemple a criação de arranjos e
mecanismos institucionais para a sua consecução, e que envolva aspectos setoriais,
regionais e locais. A ampliação do crédito para micro e pequenas empresas,
conforme já exposto, somente pode ser atingida por meio da criação de novos
mecanismos de acesso para superar os obstáculos originários da lógica do
próprio mercado de crédito. A política trabalhista também requer uma abordagem
meso e micro econômica quando se analisam a ampliação da cobertura da
seguridade social e as limitações impostas pelo aumento do custo do trabalho e
dos gastos governamentais para aumentar o número de filiações e aprimorar o
sistema. As políticas sociais, por sua vez, em razão das restrições de
recursos, exigem de forma crescente a aplicação de critérios que otimizem a
utilização dos recursos, reduzam as possibilidades de fracasso e permitam maior
controle social. Esses objetivos podem ser obtidos de uma forma mais eficaz em
nível local.
NOTAS
A autora agradece Anita Kon (PUC-SP), Christian
Azais (Picardie), Maria Regina Nabuco (PUC-MG), Maria de Fátima José-Silva
(Unifesp-EPM), Márcio Bobik (USP), Simão Silber (USP) e Paulo Gusmão
(Dieese-Prolam/USP) pelos debates empreendidos ao longo da elaboração deste
texto, ressaltando que as opiniões aqui expressas podem não coincidir com
aquelas manifestadas pelos pesquisadores citados.
1.
Especialmente na defesa da abolição do trabalho infantil, integram o sistema da
ONU outras organizações, sobretudo as seguintes: Organização das Nações Unidas
para Ciência, Educação e Cultura (Unesco), Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento Econômico (PNUD) e Fundo das Nações Unidas para a Infância
(Unicef).
2.
Liberdade de associação e proteção ao direito de organização, 1948, no
87; Direito de organização e de negociação coletiva, 1949, no
98; Trabalho forçado, 1930, no 29; Abolição do trabalho
forçado, 1957, no 105; Igualdade de remuneração, 1951, no
100; Discriminação (emprego e ocupação), 1958, no 111; Idade
mínima (para o trabalho), 1973, no 138; Piores formas de
trabalho infantil, 1999, no 182.
3.
Adota-se neste, assim como em outros estudos realizados anteriormente, a
definição da OIT sobre setor informal, como se segue: "The informal sector
is a subset of household enterprises, i.e. unincorporated enterprises owned and
operated by households or household members, either individually or in
partnership with others. As opposed to corporations or quasi-corporations
household enterprises are defined in SNA as production units which are not
coinstituted as legal entities separate from their owner(s) and which do not
have a complete set of business accounts, including balance sheets of assets
and liabilities. Thus, the type of legal organization of the unit and the type
of accounts kept are the first two criteria of the proposed international
definition of the informal sector" (OIT, 1993:26). Esta definição
ganha maior clareza, em 1997, com a seguinte complementação: "[...]
the informal sector has to be defined in terms of characteristics of the
production units (enterprises) in whcich the activities take place, rather in
terms of the characteristics of the persons involved or of their jobs.
Accordingly, the population employed in the informal sector was defined as
comprising all persons, who during a given reference period, were employed in
at least one preoduction unit of the informal sector, irrespective of their
status of employment and whether it is their main or secondary job. [...]
Persons exlusively employed in production units outside the informal sector are
excluded, no matter how precarious their employment situation may be. Thus the
concept of persons employed in the informal sector is not identical whith the concept
of persons employed in the informal employment relationship"
(Hussmans, 1997:6-7).
4.
Esses termos são utilizados de acordo com Standing (2000).
5.
O termo Processo de Informalidade denomina, neste estudo, o processo de
mudanças estruturais na produção, no emprego e nas instituições que se
estabelece na sociedade contemporânea, em um primeiro plano, com base na
liberalização do comércio e da maior integração das economias à economia
mundial, em um segundo plano, em cada sociedade específica, as mudanças
estruturais decorrem de seus processos de reestruturação produtiva e de
reterritorialização. Na dimensão do mercado de trabalho representa os processo
de destruição, adaptação e redefinição das: relações de produção; processos de
trabalho; formas de inserção de trabalho; relações e contratos de trabalho; e
conteúdo das ocupações. Esses processos societários transformam e constroem a
sociedade contemporânea, e indicam um duplo efeito: de um lado, corroem ou
tornam inadequadas determinadas práticas ou instituições sociais, pelos custos
diretos ou indiretos envolvidos, ou perda de sua funcionalidade ou de
legitimidade política; de outro, constituem, adaptam e definem normas,
procedimentos e instituições. O Processo de Informalidade implica dessa
maneira construção ou adaptação de regras consuetudinárias ou jurídicas no
mercado de trabalho consoantes com três dimensões concretas do momento
contemporâneo, ou seja, econômica, social e política (Cacciamali, 2001;
Cacciamali, 2000).
6.
Argumentos teóricos e exemplos sobre os aspectos positivos da descentralização
nas negociações coletivas podem ser encontrados no campo da saúde e segurança
do trabalho, conforme Cacciamali e Sandoval, 2001.
7.
As alterações nas relações de emprego podem ser analisadas mediante tipologia
exposta em Cacciamali (2001). Essa tipologia expõe as modificações que podem
ser verificadas nas regras contratuais referentes aos principais componentes do
contrato de trabalho assalariado, bem como nas práticas de contratação, na
mudança dos períodos de acumulação fordista para aquele de acumulação flexível
e maior internacionalização das economias.
8.
Em muitos países a legislação vem sendo modificada, dilatando o prazo de
duração desse tipo de contrato, que em geral é de 12 meses, podendo ser
renovado. No Peru, por exemplo, o prazo é de 36 meses, podendo perdurar até 5
anos.
9.
No Brasil, ao contrário, desde os anos 80, o emprego assalariado sem registro
apresenta crescimento superior ao do total de ocupados, e representa, no ano de
2000, nas seis maiores áreas Metropolitanas cerca de 28% do total da ocupação.
10.
Setor informal, conforme enunciado em nota anterior, é uma categoria que
representa o conjunto de atividades econômicas organizadas sob a forma de
trabalho por conta própria ou de microempresa, conforme apresentado em inúmeros
trabalhos e referendado pela OIT (1993). Sobre a dinâmica do setor informal,
veja-se por exemplo, Cacciamali, 1983 e 2000.
11.
Destaca-se que o objetivo da construção desses indicadores não é auferir com
precisão as perdas de receita à Seguridade Social Pública, mas apontar a ordem
de grandeza entre valor de contribuição e número de contribuintes com relação
aos seus valores potenciais.
12.
Entre as principais modalidades de emprego flexíveis, pode-se citar os
seguintes tipos de contrato: em tempo parcial (número de horas inferior ao
padrão nacional); temporário (contrato por duração de tempo determinado para
obter uma quantidade de produtos ou serviços estabelecidos, incluindo-se o
trabalho organizado por agência de trabalho temporário); terceirizado
(contratação realizada exteriormente à empresa por meio de subcontratação ou
intermediação de uma firma); eventual (de caráter irregular ou intermitente);
capacitação ou aprendizagem (inclui uma combinação de emprego e capacitação
profissional); sazonal (intermitente durante uma época do ano). Esta tipologia
foi adaptada com base em Ozaki (2000) e encontra-se desenvolvida em Cacciamali,
2001.
13.
Critérios de justiça salarial são construídos socialmente, como também
compreendem componentes subjetivos; entretanto, essa denominação é utilizada,
neste trabalho, no âmbito da área de conhecimento da teoria econômica, na qual
a percepção do empregado é influenciada por seu grupo de referência: como os
outros membros do grupo são tratados e como sua posição relativa é
salvaguardada ou reduzida (Simon, 1991; Kahneman et alii, 1986).
14.
Refere-se aqui aos assalariados que não possuem contrato de trabalho registrado
e aos trabalhadores do setor informal.
15.
A taxa de desconto intertemporal para as decisões de renda das camadas mais
pobres é elevada. Este comportamento verifica-se também nas decisões de
educação, treinamento e habitação entre outras.
16.
Debate recente sobre o grau de desigualdade na distribuição de renda no Brasil
pode ser encontrado em Henriques, 2000, a interpretação da desigualdade desde
os anos 60 em Cacciamali, 2001.
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